Entre 30 de setembro e 10 de outubro, o MilkPoint
realizou sua primeira viagem técnica ao exterior, conduzindo em parceria
com a Caep Brasil,
um grupo de 28 pessoas, englobando técnicos, produtores, representantes
de cooperativas e indústria de laticínios, estudantes e pesquisadores.
O grupo conheceu propriedades leiteiras nos estados de Wisconsin e Indiana, visitou a World Dairy Expo, maior exposição do setor no mundo, e teve um dia de palestras no prédio do USDA, na Universidade de Wisconsin.
Para mim, a viagem teve um sabor especial, já que havia percorrido um trajeto semelhante há 21 anos, durante um inverno no Meio-Oeste norte-americano. Naquela época, Wisconsin perdia espaço para os grandes produtores da Califórnia; o modelo de produção familiar estava em cheque, com muitos pequenos produtores deixando a atividade.
Nessa viagem feita na época em que internet nem existia comercialmente, o sistema mais comum era aquele em que as vacas ficavam presas individualmente, os chamados "stanchion barns" ou "tie stall". Eram utilizados silos aéreos de concreto ou do tipo Harvestore para silagem de milho e alfafa, e a eficiência da mão-de-obra, via de regra representada pela própria família do produtor, era baixa (fotos 1 e 2).
Figura 1. Wisconsin, nos EUA
Foto 1. Fazenda típica do Meio-Oeste (fonte: www.planetware.com)
Foto 2. Tie stall em Wisconsin (Fonte: http://frankenmuthfarm.com/tag/dairy-farming/page/2/)
Esse sistema não tinha como competir com os grandes produtores do Oeste, com 1000, 2000 vacas em lactação, com tudo terceirizado (inclusive volumosos) e com mão-de-obra de origem latino-americana, mais barata e disposta a trabalhar muitas horas por dia em troca de um bom salário e do sonho de, um dia, retornar com algum dinheiro a seus países de origem.
Lembro-me de ter visitado algumas propriedades em Wisconsin que me deram a clara sensação de que não estariam lá em alguns poucos anos: o proprietário cansado, endividado, sem condições de investir; os filhos pouco interessados em permanecer na atividade; o sistema fadado a perder competitividade perto dos mega-projetos do Oeste (Arizona, Califórnia, Texas, Idaho, Oregon).
Com efeito, como mostra o gráfico 1, Wisconsin tinha cerca de 25.000 fazendas em 1990, produzindo 11 bilhões de litros anuais, o que dava 1200 kg de leite/fazenda/dia. Considerando uma média de 25 kg/vaca/dia, cada produtor teria cerca de 50 vacas. Vale notar, pelo gráfico, que o estado que até então fora o maior produtor norte-americano, a Minas Gerais dos EUA, já teve mais de 150 mil fazendas de leite, de forma que as 25.000 de 1990 já representavam o resultado de um forte processo de consolidação na produção. Hoje, 2,6% da população está no campo em Wisconsin, contra 1,7% nos EUA. É, portanto, um estado mais rural, apesar da população no campo ser mínima perto do total.
Gráfico 1. Menos fazendas, mais leite
Mas como estaria Wisconsin, 20 anos depois?
O mesmo gráfico 1 mostra que a sangria continuou. Em 2011, já eram pouco mais de 12.000 fazendas (ainda 23,5% das fazendas do país), produzindo mais de 12 bilhões de kg anuais (13,3% do leite dos EUA), um aumento de cerca de 100% no tamanho médio da propriedade, mas resultando em média ainda abaixo do restante do país. Rodando pelas belas estradas de Wisconsin, é muito comum ver diversos barracões abandonados, remanescentes de uma época que não existe mais (foto 3). A mudança ainda está acontecendo: Wisconsin, como todo o Meio-Oeste, é uma região acima de tudo de pequenos produtores, onde o pequeno tem 80 a 100 vacas e não mais 20 ou 30 como no passado.
Foto 3. Barracões abandonados: uma das 150 mil fazendas que deixaram a atividade nos últimos 80 anos (Foto: Mike Kohlbauer, no Flickr)
Pequenos produtores ou encerraram as atividades ou investiram em escala e eficiência, como a Karstenschmidt Farms, onde 2 robôs fazem a ordenha das 110 vacas em lactação, com média de 45 kg/dia, CCS de 140.000 e CBT de 3.000. A média (2011) das 1,265 milhão de vacas de Wisconsin foi de 9.375 kg/vaca/ano. Alta produtividade dentro do sistema que se propõe a se explorar.
Ao mesmo tempo, surgem grandes projetos de empresas familiares, como a Larson Acres, a Pagel's Ponderosa e a Crave Brothers, que inclusive construiu o primeiro free stall de Wisconsin, no final da década de 80. Fazendas com 1000, 2000, 4000 vacas em lactação, barracões enormes com uso altamente eficiente da mão-de-obra, tratamento de dejetos - muitas com biogestores, vendendo energia para a companhia elétrica ou gerando sua própria energia.
Foto 4. Grupo na Pagel's Ponderosa, que promove o leite junto a comunidade e gera energia para a cidade vizinha
A rigor, o Meio-Oeste vem recuperando o vigor perdido (gráfico 2), ao passo que o Oeste vem patinando nos últimos anos. Não deixa de ser interessante que, no espaço de duas décadas, uma região estagnada(para não ser muito rigoroso), tenha se reinventado, voltando a ser competitiva.
Gráfico 2: a região do Meio-Oeste, em que Wisconsin se encontra, vem recuperando produção ao passo que o então eficiente Oeste vem patinando (Fonte: Stephenson, 2012).
Dentro do Meio-Oeste, Wisconsin é um exemplo vivo de retomada da eficiência perdida, um tema atual e aplicável ao Brasil de hoje, ainda que nossa realidade seja bastante diferente.
O que explica essa reviravolta?
Parte disso está no próprio processo de profissionalização da atividade que sempre foi e continua sendo importante no estado. Wisconsin é a America's Dairyland, como está na placas dos carros; a World Dairy Expo, maior exposição do mundo, teve neste ano mais de 800 empresas expondo, em um evento que talvez seja maior do que a Agrishow. Ao rodarmos pelo estado, é comum vermos uma fazenda atrás da outra, o que facilita a logística de coleta de leite e do oferecimento de serviços, bem como o compartilhamento de equipamentos, como o verificado na Crave Brothers, que mesmo com suas 2300 vacas e mais de 100 mil litros diários, compartilha grandes implementos com seus vizinhos.
Tudo isso significa que há expertise e massa crítica na região. A Universidade de Wisconsin e o laboratório do USDA lá existente reúnem alguns dos maiores nomes do setor quando se fala em pesquisa e extensão, muitos deles conhecidos dos brasileiros. Tivemos algumas palestras extremamente aplicadas, mostrando que a Universidade está, de fato, conectada com as necessidades do campo, incluindo o relato de diversos experimentos feitos em fazendas comerciais, visando resolver os problemas do produtor. Além do bacharelado de 4 anos em produção de leite, a Universidade tem um curso condensado, de 4 meses, pelo qual a maior parte dos melhores produtores de WI passaram. Detalhe: o curso é oferecido desde...1885!
A estação do USDA, que funciona como uma espécie de Embrapa, está dentro da Universidade e inclusive divide com ela uma estação experimental. Segundo o diretor da unidade, o pesquisador Glen Broderick, a estação do USDA gerou beneficíos acima de US$ 1,5 bilhão anuais, em maior eficiência do uso de nutrientes aos produtores e redução da perda de nutrientes no solo.
Há ainda na Universidade, o Babcock Institute, criado pelo USDA, oferece treinamento em diversas áreas e cria cursos sob demanda, que podem ser dados em outros países. O Babcock também tem uma divisão de análise de mercado e comércio internacional, visando desenvolver mercados para os produtos locais em outros países.
Igualmente, há serviços de qualidade no campo e infra-estrutura. O grupo ficou positivamente impressionado com a virtual ausência de estradas de terra, bem como com a eficiência do armazenamento e transporte de leite em tanques de expansão que, na verdade, são carretas que são engatadas e transportadas pelo caminhão para o laticínio, queimando a etapa de transferir o leite do tanque para a carreta (ver foto). Também, há diversos profissionais que prestam serviços ao produtor, como empresas de consultoria que auxiliam o produtor a gerenciar o risco, dando assessoria em contratos de opções e venda a futuro.
Foto 5. Tanques móveis de leite
O relacionamento entre produtores e indústrias e os serviços disponíveis aos fornecedores são também abrangentes. Veja o que a cooperativa Foremost Farms oferece a seus membros:
- Suporte técnico para produção de leite de qualidade e adequação a legislação
- Ferramentas online para a tomada de decisão
- Ferramentas de gestão de risco e venda a futuro de leite
- Suporte para novas oportunidades de negócios (expansão, networking, oportunidades de negócios)
- Análises de leite (CCS, PI, MUN, antibióticos, cultura do tanque e de vacas individuais, controle de processos)
- US$ 20.000 anuais em bolsas de estudo para seus membros ou filhos
- Programa de formação de líderes
Um fator adicional na retomada dessa competitividade está na característica de produção de volumosos e, eventualmente, grãos nas propriedades. Com a elevação da cotação dos grãos a partir de 2007 e com o aumento da volatilidade destes insumos, o sistema de aquisição de todos os alimentos fora da propriedade, como o californiano, tornou-se mais arriscado. Quem produz o volumoso, e eventualmente, parte do próprio concentrado, tem seu risco diminuído. É o caso do modelo de Wisconsin e estados vizinhos. John Pagel, da Pagel's Ponderosa, por exemplo, produz silagem a US$ 38/tonelada; para comprar, paga US$ 52/tonelada.
O Prof. Mark Stephenson, que deu uma ótima palestra para o grupo no Seminário que realizamos em Madison, mostrou que muitos produtores nos EUA buscam hoje uma estratégia de redução dos custos variáveis, que via de regra são altos em sistemas confinados. Uma das alternativas teóricas é a utilização de pastagens, que são pouco viáveis nessa região do país, em que a vegetação não cresce durante muitos meses do ano, fazendo com que o produtor tenha que ter muita forragem conservada e sua estrutura correspondente, pouco aliviando a situação. A outra estratégia para reduzir a exposição a custos variáveis é depender menos de insumos de terceiros.
Outros aspectos que chamaram a atenção do grupo:
- não se vê "ninguém" nas fazendas; mesmo as grandes, o que indica a eficiência de uso do trabalho e o grau de automação.
- muitas fazendas top não utilizam o médico veterinário como rotina; sua atuação é mais gerencial. O trabalho básico é feito pelos próprios funcionários em muitas fazendas, inclusive cirurgias de deslocamento de abomaso, e outras.
- o meio ambiente vem sendo encarado de forma séria pelas fazendas. Há o firme propósito de reduzir a pegada de carbono e, se possível, ganhar dinheiro com a venda de energia ou com a adubação mais homogênea da área agrícola com o esterco líquido.
- apesar de termos visitado fazendas excelentes, vimos também outras menos excelentes. Isso nos faz lembrar que, certamente, há muitas outras piores; afinal, o processo de concentração ainda continua e faz suas vítimas.
- limpeza: apesar do tamanho das fazendas, chamou a atenção a limpeza. Não tem uma coisa fora do lugar, uma sujeira sequer. Claro que, novamente, são as melhores fazendas.
Foto 6. Barrações enormes na Larson Acres, com ventilação cruzada
Foto 7. Robôs fazem o serviço
Claro que há desafios, que inclusive transcendem a situação de WI e reverberam por todos os Estados Unidos: como lidar com a volatilidade? Vale a pena ser exportador? Deve-se ter uma atividade mais regulamentada (como as cotas de produção do Canadá) ou menos (como a Nova Zelândia)? Como competir com players de baixo custo variável, como os da América da Sul e a própria Nova Zelândia? Que sistemas são mais eficientes?
Em essência, muitas das dúvidas que temos também fazem parte do dia-a-dia do produtor norte-americano. O que chama a atenção, porém, é que a profissionalização existe e vem se intensificando. Não tenho dúvida que, à nossa maneira, chegaremos também em um formato de profissionalização que, ao menos, nos fará explorar nossos sistemas de forma eficiente - e talvez leve menos tempo do que imaginemos, ainda que, à primeira vista, o desafio pareça enorme.
PS: diante do sucesso e do interesse despertado na viagem, estamos estruturando nova turma para 2013, bem como uma viagem a Nova Zelândia. Fique atento!
Foto 8. Momento de lazer do grupo na bela Chicago
O grupo conheceu propriedades leiteiras nos estados de Wisconsin e Indiana, visitou a World Dairy Expo, maior exposição do setor no mundo, e teve um dia de palestras no prédio do USDA, na Universidade de Wisconsin.
Para mim, a viagem teve um sabor especial, já que havia percorrido um trajeto semelhante há 21 anos, durante um inverno no Meio-Oeste norte-americano. Naquela época, Wisconsin perdia espaço para os grandes produtores da Califórnia; o modelo de produção familiar estava em cheque, com muitos pequenos produtores deixando a atividade.
Nessa viagem feita na época em que internet nem existia comercialmente, o sistema mais comum era aquele em que as vacas ficavam presas individualmente, os chamados "stanchion barns" ou "tie stall". Eram utilizados silos aéreos de concreto ou do tipo Harvestore para silagem de milho e alfafa, e a eficiência da mão-de-obra, via de regra representada pela própria família do produtor, era baixa (fotos 1 e 2).
Figura 1. Wisconsin, nos EUA
Foto 1. Fazenda típica do Meio-Oeste (fonte: www.planetware.com)
Foto 2. Tie stall em Wisconsin (Fonte: http://frankenmuthfarm.com/tag/dairy-farming/page/2/)
Esse sistema não tinha como competir com os grandes produtores do Oeste, com 1000, 2000 vacas em lactação, com tudo terceirizado (inclusive volumosos) e com mão-de-obra de origem latino-americana, mais barata e disposta a trabalhar muitas horas por dia em troca de um bom salário e do sonho de, um dia, retornar com algum dinheiro a seus países de origem.
Lembro-me de ter visitado algumas propriedades em Wisconsin que me deram a clara sensação de que não estariam lá em alguns poucos anos: o proprietário cansado, endividado, sem condições de investir; os filhos pouco interessados em permanecer na atividade; o sistema fadado a perder competitividade perto dos mega-projetos do Oeste (Arizona, Califórnia, Texas, Idaho, Oregon).
Com efeito, como mostra o gráfico 1, Wisconsin tinha cerca de 25.000 fazendas em 1990, produzindo 11 bilhões de litros anuais, o que dava 1200 kg de leite/fazenda/dia. Considerando uma média de 25 kg/vaca/dia, cada produtor teria cerca de 50 vacas. Vale notar, pelo gráfico, que o estado que até então fora o maior produtor norte-americano, a Minas Gerais dos EUA, já teve mais de 150 mil fazendas de leite, de forma que as 25.000 de 1990 já representavam o resultado de um forte processo de consolidação na produção. Hoje, 2,6% da população está no campo em Wisconsin, contra 1,7% nos EUA. É, portanto, um estado mais rural, apesar da população no campo ser mínima perto do total.
Gráfico 1. Menos fazendas, mais leite
Mas como estaria Wisconsin, 20 anos depois?
O mesmo gráfico 1 mostra que a sangria continuou. Em 2011, já eram pouco mais de 12.000 fazendas (ainda 23,5% das fazendas do país), produzindo mais de 12 bilhões de kg anuais (13,3% do leite dos EUA), um aumento de cerca de 100% no tamanho médio da propriedade, mas resultando em média ainda abaixo do restante do país. Rodando pelas belas estradas de Wisconsin, é muito comum ver diversos barracões abandonados, remanescentes de uma época que não existe mais (foto 3). A mudança ainda está acontecendo: Wisconsin, como todo o Meio-Oeste, é uma região acima de tudo de pequenos produtores, onde o pequeno tem 80 a 100 vacas e não mais 20 ou 30 como no passado.
Foto 3. Barracões abandonados: uma das 150 mil fazendas que deixaram a atividade nos últimos 80 anos (Foto: Mike Kohlbauer, no Flickr)
Pequenos produtores ou encerraram as atividades ou investiram em escala e eficiência, como a Karstenschmidt Farms, onde 2 robôs fazem a ordenha das 110 vacas em lactação, com média de 45 kg/dia, CCS de 140.000 e CBT de 3.000. A média (2011) das 1,265 milhão de vacas de Wisconsin foi de 9.375 kg/vaca/ano. Alta produtividade dentro do sistema que se propõe a se explorar.
Ao mesmo tempo, surgem grandes projetos de empresas familiares, como a Larson Acres, a Pagel's Ponderosa e a Crave Brothers, que inclusive construiu o primeiro free stall de Wisconsin, no final da década de 80. Fazendas com 1000, 2000, 4000 vacas em lactação, barracões enormes com uso altamente eficiente da mão-de-obra, tratamento de dejetos - muitas com biogestores, vendendo energia para a companhia elétrica ou gerando sua própria energia.
Foto 4. Grupo na Pagel's Ponderosa, que promove o leite junto a comunidade e gera energia para a cidade vizinha
A rigor, o Meio-Oeste vem recuperando o vigor perdido (gráfico 2), ao passo que o Oeste vem patinando nos últimos anos. Não deixa de ser interessante que, no espaço de duas décadas, uma região estagnada(para não ser muito rigoroso), tenha se reinventado, voltando a ser competitiva.
Gráfico 2: a região do Meio-Oeste, em que Wisconsin se encontra, vem recuperando produção ao passo que o então eficiente Oeste vem patinando (Fonte: Stephenson, 2012).
Dentro do Meio-Oeste, Wisconsin é um exemplo vivo de retomada da eficiência perdida, um tema atual e aplicável ao Brasil de hoje, ainda que nossa realidade seja bastante diferente.
O que explica essa reviravolta?
Parte disso está no próprio processo de profissionalização da atividade que sempre foi e continua sendo importante no estado. Wisconsin é a America's Dairyland, como está na placas dos carros; a World Dairy Expo, maior exposição do mundo, teve neste ano mais de 800 empresas expondo, em um evento que talvez seja maior do que a Agrishow. Ao rodarmos pelo estado, é comum vermos uma fazenda atrás da outra, o que facilita a logística de coleta de leite e do oferecimento de serviços, bem como o compartilhamento de equipamentos, como o verificado na Crave Brothers, que mesmo com suas 2300 vacas e mais de 100 mil litros diários, compartilha grandes implementos com seus vizinhos.
Tudo isso significa que há expertise e massa crítica na região. A Universidade de Wisconsin e o laboratório do USDA lá existente reúnem alguns dos maiores nomes do setor quando se fala em pesquisa e extensão, muitos deles conhecidos dos brasileiros. Tivemos algumas palestras extremamente aplicadas, mostrando que a Universidade está, de fato, conectada com as necessidades do campo, incluindo o relato de diversos experimentos feitos em fazendas comerciais, visando resolver os problemas do produtor. Além do bacharelado de 4 anos em produção de leite, a Universidade tem um curso condensado, de 4 meses, pelo qual a maior parte dos melhores produtores de WI passaram. Detalhe: o curso é oferecido desde...1885!
A estação do USDA, que funciona como uma espécie de Embrapa, está dentro da Universidade e inclusive divide com ela uma estação experimental. Segundo o diretor da unidade, o pesquisador Glen Broderick, a estação do USDA gerou beneficíos acima de US$ 1,5 bilhão anuais, em maior eficiência do uso de nutrientes aos produtores e redução da perda de nutrientes no solo.
Há ainda na Universidade, o Babcock Institute, criado pelo USDA, oferece treinamento em diversas áreas e cria cursos sob demanda, que podem ser dados em outros países. O Babcock também tem uma divisão de análise de mercado e comércio internacional, visando desenvolver mercados para os produtos locais em outros países.
Igualmente, há serviços de qualidade no campo e infra-estrutura. O grupo ficou positivamente impressionado com a virtual ausência de estradas de terra, bem como com a eficiência do armazenamento e transporte de leite em tanques de expansão que, na verdade, são carretas que são engatadas e transportadas pelo caminhão para o laticínio, queimando a etapa de transferir o leite do tanque para a carreta (ver foto). Também, há diversos profissionais que prestam serviços ao produtor, como empresas de consultoria que auxiliam o produtor a gerenciar o risco, dando assessoria em contratos de opções e venda a futuro.
Foto 5. Tanques móveis de leite
O relacionamento entre produtores e indústrias e os serviços disponíveis aos fornecedores são também abrangentes. Veja o que a cooperativa Foremost Farms oferece a seus membros:
- Suporte técnico para produção de leite de qualidade e adequação a legislação
- Ferramentas online para a tomada de decisão
- Ferramentas de gestão de risco e venda a futuro de leite
- Suporte para novas oportunidades de negócios (expansão, networking, oportunidades de negócios)
- Análises de leite (CCS, PI, MUN, antibióticos, cultura do tanque e de vacas individuais, controle de processos)
- US$ 20.000 anuais em bolsas de estudo para seus membros ou filhos
- Programa de formação de líderes
Um fator adicional na retomada dessa competitividade está na característica de produção de volumosos e, eventualmente, grãos nas propriedades. Com a elevação da cotação dos grãos a partir de 2007 e com o aumento da volatilidade destes insumos, o sistema de aquisição de todos os alimentos fora da propriedade, como o californiano, tornou-se mais arriscado. Quem produz o volumoso, e eventualmente, parte do próprio concentrado, tem seu risco diminuído. É o caso do modelo de Wisconsin e estados vizinhos. John Pagel, da Pagel's Ponderosa, por exemplo, produz silagem a US$ 38/tonelada; para comprar, paga US$ 52/tonelada.
O Prof. Mark Stephenson, que deu uma ótima palestra para o grupo no Seminário que realizamos em Madison, mostrou que muitos produtores nos EUA buscam hoje uma estratégia de redução dos custos variáveis, que via de regra são altos em sistemas confinados. Uma das alternativas teóricas é a utilização de pastagens, que são pouco viáveis nessa região do país, em que a vegetação não cresce durante muitos meses do ano, fazendo com que o produtor tenha que ter muita forragem conservada e sua estrutura correspondente, pouco aliviando a situação. A outra estratégia para reduzir a exposição a custos variáveis é depender menos de insumos de terceiros.
Outros aspectos que chamaram a atenção do grupo:
- não se vê "ninguém" nas fazendas; mesmo as grandes, o que indica a eficiência de uso do trabalho e o grau de automação.
- muitas fazendas top não utilizam o médico veterinário como rotina; sua atuação é mais gerencial. O trabalho básico é feito pelos próprios funcionários em muitas fazendas, inclusive cirurgias de deslocamento de abomaso, e outras.
- o meio ambiente vem sendo encarado de forma séria pelas fazendas. Há o firme propósito de reduzir a pegada de carbono e, se possível, ganhar dinheiro com a venda de energia ou com a adubação mais homogênea da área agrícola com o esterco líquido.
- apesar de termos visitado fazendas excelentes, vimos também outras menos excelentes. Isso nos faz lembrar que, certamente, há muitas outras piores; afinal, o processo de concentração ainda continua e faz suas vítimas.
- limpeza: apesar do tamanho das fazendas, chamou a atenção a limpeza. Não tem uma coisa fora do lugar, uma sujeira sequer. Claro que, novamente, são as melhores fazendas.
Foto 6. Barrações enormes na Larson Acres, com ventilação cruzada
Foto 7. Robôs fazem o serviço
Claro que há desafios, que inclusive transcendem a situação de WI e reverberam por todos os Estados Unidos: como lidar com a volatilidade? Vale a pena ser exportador? Deve-se ter uma atividade mais regulamentada (como as cotas de produção do Canadá) ou menos (como a Nova Zelândia)? Como competir com players de baixo custo variável, como os da América da Sul e a própria Nova Zelândia? Que sistemas são mais eficientes?
Em essência, muitas das dúvidas que temos também fazem parte do dia-a-dia do produtor norte-americano. O que chama a atenção, porém, é que a profissionalização existe e vem se intensificando. Não tenho dúvida que, à nossa maneira, chegaremos também em um formato de profissionalização que, ao menos, nos fará explorar nossos sistemas de forma eficiente - e talvez leve menos tempo do que imaginemos, ainda que, à primeira vista, o desafio pareça enorme.
PS: diante do sucesso e do interesse despertado na viagem, estamos estruturando nova turma para 2013, bem como uma viagem a Nova Zelândia. Fique atento!
Foto 8. Momento de lazer do grupo na bela Chicago
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